sexta-feira, junho 15

Tinha que ser o Velhinho


           Um caminhoneiro, bem velhinho, estava manobrando seu caminhão cheio de entulhos de obras na caçamba para sair da Universidade. Para sair, ele deveria manobrá-lo de uma maneira delicada, pois a largura e a altura do espaço eram bem estreitas, mas permitindo que o caminhão conseguisse passar mesmo assim. Afinal, ele entrou por ali. Eram três colunas de sustentação à esquerda e à direita totalizando seis colunas. Naquele espaço, também, ocorre o trânsito dos funcionários, estudantes e professores que entram e saem da Universidade com tamanha frequência em direção à Santa Casa.
A odisséia começou quando ele manobrou seu caminhão laranja, também velho e vivido, para sair e notou que não conseguiria, pois havia um carro de um funcionário impedindo ainda mais o caminho. Da forma como ele fora estacionado, o espaço para o caminhão passar ficara mais estreito ainda. O suficiente para o caminhão não conseguir passar e o velhinho coçar a sua cabeça cheia de cabelos brancos.
Ele desligou o caminhão. Abriu a porta. Saiu. Era tão pequeno que quando abriu a porta para sair, não o via-se, viam-se suas pequeninas botas pretas tocando o chão. Quando ele bateu a porta, tinha cerca de 1,50 cm. Ficou parado analisando o problema. Seus lábios balbuciaram algo. Provavelmente algum comentário espirituoso sobre a situação. Coçou a cabeça e andou até os pilares. Olhou pra cima, olhou pra baixo, olhou pros lados. Virou-se até o carro e voltou a olhar para os pilares. Ficou parado se perguntando o que poderia fazer. Decidiu tomar uma atitude: foi até o carro, parou do lado dele e deu passos bem largos até o pilar da direita. Eram duas passadas e mais um meio pé dele. O velhinho já era pequeno, que dirá suas passadas! Voltou a coçar a cabeça e a resmungar. Olhou pro caminhão e pro espaço estreito. Seus olhos eram de quem não sabia o que fazer.
Encostado no caminhão laranja, de braços cruzados, pensou e pensou. Pensou tanto que parecia que nunca havia pensado na vida. Parecia que fazia algo novo. Deu um tapa na sua coxa e foi até a portaria falar com alguém. Explicou a situação. Mostrou o seu tempo. Precisava sair dali o quanto antes. A portaria pediu para um dos seguranças acompanharem-no. O velhinho não pareceu satisfeito. Não era isso!
O segurança foi até a cena da ópera e perguntou qual era o problema. O velhinho mostrou de braços abertos como se abraçasse o ar o que estava acontecendo (Como se fosse óbvio, apesar de ser!). O segurança perguntou se ele não conseguiria passar por ali. O velhinho negou. O segurança insistiu. O velhinho, numa tentativa empírica, demonstrou com suas passadas pequenas que não havia espaço. O segurança concordou. Os dois voltaram à portaria. O porteiro, o segurança e o velhinho, voltaram à cena...
O velhinho, junto com o segurança, explicou o que estava acontecendo. O porteiro perguntou se ele não conseguiria passar. O velhinho, não acreditando, decidiu mostrar as passadas novamente. O porteiro concordou. Ele também perguntou de quem era aquele carro. O velhinho negou com a cabeça. Não sabia. O segurança pegou seu rádio e mandou chamar alguém. Pediram para o pequeno senhor esperar, pois iriam fazer algo. Ele disse que tinha um tempo a seguir e os outros dois nada falaram. Deixaram-no ali esperando.
O pobre velhinho continuava preocupado com o seu caminhão atravancando o caminho. Em um gesto de esperança, desespero ou dúvida, talvez, ele voltou a contar os passos e a comparar com o tamanho do caminhão. Eis que para melhorar a história, surge uma van. O velhinho dá sinal para voltarem, mas não o obedecem. Param a van atrás do carro e no caminho da saída e dizem para ele tirar o caminhão dali. O velhinho explica a situação. Os motoristas saem dela se rindo e falam que deixarão a van estacionada ali. Ele chega a avisar que já está chegando o dono do carro. Os motoristas se riem e falam para o velhinho ficar calmo que eles serão rápidos. Quando saem cada um para fazerem a entrega, escutam-se suas risadas e seus comentários ridicularizando o velho. Ele coça a cabeça e suspira.
O segurança e o porteiro chamaram o motorista do carro que estava na frente da van, explicaram a situação e o motorista reclamou dizendo que o velho que era o chato. O segurança e o porteiro concordaram. Chegando lá fora, cumprimentam o velhinho e o motorista abre a porta do carro. O velhinho pede desculpas pelo transtorno e avisa que de nada adianta agora, pois os motoristas da van a estacionaram do outro lado da saída. O carro do motorista ficava entre a van e o caminhão. O motorista irritou-se e disse que esperaria pouco tempo, pois é um homem ocupado. O porteiro sumira e o segurança ficara olhando a cena quieto. O velhinho foi até o porteiro pedir para ele ajuda-lo a procurar os motoristas da van e este só disse que teriam que esperar. O velhinho coçou sua cabeça e voltou para seu caminhão velho.
Seu chefe ligou. Ele atendeu o celular e explicou o que estava acontecendo. Foi xingado pelo patrão e as pessoas que ficaram ao redor olhando, começavam a rir da situação e a falar quão enrolada ela era. Cada um dava seu palpite, sua análise, seu parecer e explicava, resumidamente, para quem chegava atrasado, o que estava acontecendo.
Eis que os motoristas chegaram. Entraram na van e tiraram-na. O motorista ocupado do carro entrou e fez o mesmo. O velhinho imitou, ligou o motor velho. Barulho, fumaça e desânimo pairaram no ar. Ele manobrou com calma. Girou o volante pra cá e pra lá. A roda fazia o mesmo. De fato, o lugar era muito estreito e o carro atrapalhara. Foi indo aos poucos, lentamente. Quando estava quase na saída, uma das placas de entulho que ele levava atrás do caminhão prendera no último pilar. Bateu um pouco e tirou um pequeno pedaço dele. Todos que assistiam gritaram rindo-se para o velhinho parar. Ele desligou o motor, saiu do caminhão, olhou pra cena, colocou as mãos na cabeça e suspirou.
No meio das risadas, o segurança falou a alguém:

- Ta vendo...(bufou)...Óbvio que tinha que ser o velhinho.


Matheus I. Mazzochi

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